segunda-feira, 7 de março de 2016

SE PODEMOS COMPLICAR…

Neemias Félix

Estamos tão acostumados a complicar as coisas, que quando alguém apresenta uma ideia ou um projeto simples, podemos achar um absurdo.

Gostamos tanto de complicar, que chegamos a um ponto perigoso. Para os não cristãos, por exemplo, e até para um bom número de cristãos,  acreditar na realidade de um Deus inteligente que criou Adão e Eva, no Éden, no pecado da raça e na queda parece uma ideia muito infantil. Precisamos sofisticar, complicar. Que tal a ideia de que viemos da água, éramos algo como uma ameba, viramos peixe, depois nos empoleiramos nas árvores como macacos, andamos de quatro e depois nos aprumamos para chegar a esta forma “evoluída” como somos hoje? Ah, muito mais inteligente, não é? Satisfaz os nossos padrões de orgulho, vaidade e lógica.

Mas visitemos outras áreas. Por que ajudar pessoas de maneira simples, direta e barata, individualmente, ou, no máximo, com organizações eficientes e sem burocracia? Não, isso é muito simples. Criemos ONGs, fundações e institutos e botemos o estado gordo, guloso e perdulário nesse negócio. Criemos estatutos, cargos, departamentos, comissões, recheemos tudo isso com muito papel e burocracia e vamos dar uma visibilidade louca e ativista a tudo isso. Vejam como trabalhamos! Tudo muito bonito e “social”, que é a palavrinha que encanta os “progressistas” e, é claro, os desonestos.

No âmbito do cristianismo, entretanto, a “sofisticação” não é muito diferente. Há muito se deixou aquela simplicidade, organicidade e funcionalidade tão “primitivas” dos primeiros séculos! Era outra época, tudo muito rudimentar. Vamos botar o estadão no meio. Vamos misturar um pouco com o paganismo, que assim agradamos a todo mundo. Uma adaptação aqui, uma assimilação ali, e a promiscuidade pode parecer progresso. Alarguemos a porta estreita, abramos o caminho apertado! Esse Jesus até que dizia algumas verdades, mas, convenhamos, era muito simples, tinha visão muito limitada. Vamos construir templos enormes, basílicas, catedrais. E hierarquia, é claro. Claro e clero, porque os leigos, ah, esses leigos não têm classe! Criemos soldos e vestes especiais, báculo, barrete, mitra e outros badulaques, misturemos os antigos rituais judaicos com os pagãos, depois criemos um estado especial pra cuidar de tudo e um dignitário supremo, infalível ex-cathedra e com poderes superespeciais. Perfeito para complicar, hem?

Não, isso não está certo, diz um bom rebelde. Vamos reformar. Mas não muito, que a coisa não pode ser tão simples assim. Voltemos ao fundamental, mas mantenhamos algumas inovações. Enfim, umas substituições aqui, umas assimilações ali… e tudo fica bem. Com o tempo acrescentemos departamentos, comissões, ordens, estatutos, convenções, ministérios, diretorias. Democratizemos, mas nem tanto. Falemos em sacerdócio universal, mas  deixemos só no papel. Enfim, mudemos tudo para tudo ficar no mesmo. Ora, se podemos complicar, para que simplificar? Precisamos é nos organizar cada vez melhor, quem sabe administrar as coisas como uma empresa, introduzir de vez em quando novos projetos, métodos, técnicas, programas mais modernos e eficientes. É isso! E deu no que deu. E dá no que dá.

Faz lembrar a história do fazendeiro que mandou um empregado contar o seu enorme rebanho, de milhares de cabeças de gado. No fim da tarde, ao cobrar o cumprimento da tarefa, perguntou ao funcionário o resultado de toda a operação. “Quantas cabeças?” O encarregado deu-lhe um número altíssimo. “A contagem foi muito difícil?”, perguntou novamente o patrão. “Nem um pouco”, respondeu o homem. “Foi só contar as patas e dividir por quatro.”

É assim: se podemos complicar, por que simplificar?