Neemias Félix
DIÁLOGO
IMPERTINENTE
Alto clérigo:
- Diminuir a idade da maioridade penal não resolve o
problema da violência.
Cidadão comum:
- Não quero resolver problema algum nem acabar com a
violência. Isso é impossível, já que é decorrente da queda do homem e de sua natureza
decaída. Eu só quero que o bandido de dezessete anos que me assaltou nove vezes
não me assalte pela décima vez e não me
faça amputar a outra perna por causa
de outro tiro.
Alto clérigo:
- Devemos fazer justiça, não vingança.
Cidadão comum:
- É o que eu quero também, mas o safado que estuprou
minha filha estava se vingando de quem? Essa frase devia ser dita pra ele, não
pra mim. Deixar o bandido mais tempo afastado das pessoas de bem fará diminuir,
sim, o número de assaltos que ele poderia praticar e as prováveis mortes que
ele poderia causar.
Alto clérigo:
-Devemos viver e promover a paz.
Cidadão comum:
- É o que eu sempre fiz quando trabalhava honesta e
pacificamente na minha loja. Essa frase devia ser dita para o bandido que me
assaltou dezoito vezes e me deu um tiro na boca. Mas, tudo bem, diga isso a ele
quando assaltar a sua casa.
Alto clérigo:
- É preciso ressocializar antes de punir; dar
educação, trabalho.
Cidadão comum:
- Humhum, também acho. Ressocializar o cara que
pratica pequenos furtos, que furta comida porque está com fome, que furta
remédio pra socorrer a mãe doente... O sujeito que mata o adolescente pra
roubar um tênis de marca tem que pegar cadeia braba. Aliás, ressocializar quem quer ser ressocializado, dar educação a
quem quer se educar, dar trabalho a
quem quer trabalhar, né? Tem gente
que não acha essas coisas importantes...
Alto clérigo
- Você não entende, a dívida social é muito grande...
Cidadão comum
- Se é, na época ninguém me chamou pra comprar nada;
aliás, tem dívida que fizeram por aí quando nem meu tataravô era nascido. Ora,
se eu não consigo pagar nem as dívidas atuais, como posso pagar as que existem há
centenas de anos e eu nem sei quem fez? Ô reverendo, tem dó, né... Trabalho
duro desde os nove anos de idade e tenho uma família, que sustento com muita
dificuldade. Acho que o senhor é que tinha que me arranjar algum pra pagar as minhas dívidas. Até logo e bença...
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